Liberdade, Verdade e Escuta: Elementos de uma comunicação transformadora 5n2u41
30/05/2025
Acreditar que a comunicação é a base da construção do conhecimento, assim como pode ser vista como um processo de fortalecimento de uma sociedade mais consciente e justa, é um importante caminho para que possamos contribuir com a ampliação de uma realidade voltada para o bem comum de forma fraterna e universal.
Na mensagem para o 59º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que será celebrado no próximo dia 1º de junho, Domingo da Ascensão do Senhor, Papa Francisco inspirou-se no Ano Santo Jubilar da Esperança. Com o título: “Partilhai com mansidão a esperança que está nos vossos corações (cf. 1 Pd 3,15-16)”, o Santo Padre buscou inspiração em São Francisco de Sales, patrono dos escritores e dos jornalistas, também conhecido como “Doutor da Mansidão”, visto que divulgou o texto em 24 de janeiro deste ano, data em que celebramos a memória deste santo.
E foi com mansidão que o Pontífice conduziu seu último texto para a data, trazendo referências como: Dom Tonino Bello, bispo italiano, falecido em 1993, que desafiou a injustiça, defendeu a dignidade humana e tornou-se a voz dos que não têm voz; Georges Bernanos, escritor e jornalista católico, que viveu na França entre os séculos XIX e XX, e trouxe em seus discursos a esperança como algo a ser conquistado coletivamente. O Papa também transitou pela Primeira Carta de São Pedro (cf. 3,15-16), na qual aponta que, nesse escrito, é possível observar a relação da esperança com o testemunho e a comunicação cristã. Ele chega a Martin Luther King, um dos principais líderes negros na luta contra a discriminação racial nos Estados Unidos, no século XX, para fortalecer em sua mensagem a importância da solidariedade e da compaixão no decorrer da vida, especialmente quando comunicamos com o coração desarmado, fortalecido pela fé e esperança em Deus.
Em meio à sua profundidade discursiva para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, criado em 1966 pelo decreto “Inter Mirifica”, no âmbito do Concílio Vaticano II, o Papa Francisco fez apontamentos que, na atualidade, interferem diretamente na forma de ver, sentir e agir da sociedade diante das realidades apresentadas pelo mundo. A escolha da data feita pelo Papa Paulo VI , no mesmo dia da Solenidade da Ascenção do Senhor, é para nos lembrar que a comunicação também está a serviço do anúncio da Palavra de Deus. Jesus leva para o céu a nossa humanidade, e deixa para seus discípulos a tarefa de seguir pelo mundo propagando o Evangelho a toda criatura. (Mc 16,15).
Nos cursos de formação para jornalistas, quando se estudam formatos textuais para a produção de informações e notícias, sempre é levado à reflexão alguns questionamentos: Para quem estou produzindo determinado conteúdo? Por que estou desenvolvendo aquela produção? Qual a minha intencionalidade ou resultado esperado com aquele texto, vídeo ou áudio que estou gerando?
Francisco faz importantes alertas sobre os riscos de uma comunicação movida pelo “desespero, preconceitos e rancores, fanatismo e até ódio”. Nesse contexto, ele chama a atenção para o risco do uso da comunicação como um instrumento de manipulação e de controle a partir das inseguranças. Ele também apresenta o fenômeno da “’dispersão programada da atenção’ através de sistemas digitais”, fazendo referência ao uso estratégico dos algoritmos a favor de uma comunicação anestésica e dispersiva.
Como saída para inverter esse cenário comunicativo corrompido, o Santo Padre convida os comunicadores para a promoção de uma comunicação desarmada, regada pela esperança, pela determinação de ir ao encontro de Deus e dos irmãos, sem as amarras das injustiças, da dor, do desprezo e dos interesses econômicos e políticos.
Lição que começa em casa
Mesmo quando temos uma noção ampla da celebração do Dia Mundial das Comunicações Sociais, é importante lembrar que toda boa lição começa em casa. Precisamos partir da nossa realidade, para depois estender nossa visão para o todo e analisar criticamente, além de nossas fronteiras. O que vejo, sinto e vivo onde estou, quando o assunto é comunicação? O que acredito, confio, luto e acolho com o coração para agir a favor da paz e do bem?
Para compreender um pouco mais a nossa realidade, basta destinarmos um breve olhar para o artigo 220 da Constituição Federal do Brasil, que trata da liberdade de expressão, que em seu parágrafo 5º, diz:
“Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.”
Observando a lei e refletindo sobre ela, vemos que uma situação ideal seria o que, de fato, nos apresenta a principal lei do nosso país. A outra dimensão está na realidade que encontramos com a presença das grandes empresas de comunicação que alimentam a população com suas mais variadas criações de comunicação, permeadas por diferentes interesses de um mercado que movimenta milhões de reais em nosso país.
Certamente, esse ambiente que vemos em nosso país não é diferente em outras localidades do mundo. Por isso, precisamos de uma comunicação corajosa que também esteja presente na Igreja de forma lúcida, coerente, crítica e elucidativa, podendo ser, principalmente, libertadora.
Em entrevista à Rádio Frei Galvão, localizada na cidade de Guaratinguetá (SP), o Vigário da Província da Imaculada Conceição do Brasil, Frei Gustavo Wayand Medella, mencionando Papa Paulo VI, autor da primeira mensagem para o Dia Mundial das Comunicações, em maio de 1967, disse que essa data tem como objetivo sensibilizar todos os cristãos sobre a importância da comunicação como ferramenta de evangelização e transformação social. Segundo ele, trata-se de um chamado à ação generosa, em união de orações e iniciativas com pastores e demais colaboradores, a fim de alcançar, com a ajuda de Deus e a intercessão da Virgem Maria, os frutos esperados para o bem da família humana.
O frade destacou três ensinamentos fundamentais da mensagem do Papa Francisco sobre comunicar com esperança: confessar Cristo como Senhor; dar razão da esperança com testemunho; e comunicar com mansidão e respeito. “Mais do que fazer comunicação, mais do que operar aparelhos que comunicam, nós podemos dizer sem medo que somos comunicação, e desejamos ser cada vez mais amorosos, generosos, pacíficos, realizados e felizes, e que a nossa comunicação também transmita todos esses valores. Quando a Igreja celebra a Solenidade da Ascensão do Senhor, é hora também de recordarmos a nossa responsabilidade como discípulos, missionários, enviados pelo próprio Cristo para pregar o Evangelho em toda parte e a toda criatura”, concluiu o Vigário provincial.
De acordo com Frei Augusto Luiz Gabriel, presidente da Fundação Frei Rogério e vice-diretor da Rede Celinauta de Comunicação, de Pato Branco (PR), neste tempo marcado pela desinformação e pela polarização, no qual alguns centros de poder controlam uma grande massa de dados e de informações sem precedentes, é necessário o trabalho de jornalistas e comunicadores conscientes do seu compromisso com a sociedade. “Precisamos do compromisso corajoso em colocar no centro da comunicação a responsabilidade pessoal e coletiva para com o próximo.”
Segundo ele, para construirmos uma comunicação verdadeiramente cristã, precisamos de alguns elementos fundamentais que encontramos na vida e no Evangelho. “A Comunicação Cristã deveria privilegiar, primeiramente, a escuta. Primeiro, fazer o exercício da escuta ativa, onde se procura de fato entrar de corpo e alma na história do outro num esforço de empatia e compreensão”, salientou.
O frade ainda ressaltou que, conforme apresentou o Papa Francisco, o segundo elemento importante é o diálogo: “O verdadeiro diálogo é um encontro profundo de almas, que se expressa em gestos e palavras. É um intercâmbio transformador, capaz de atingir o coração da pessoa para mudá-la a partir de dentro”, ensinou.
Ele também reforçou a esperança como terceiro elemento abordado na mensagem deste ano. “Precisamos agir com mansidão e jamais nos esquecer do rosto do outro; não permitir que os instintos de egoísmo, disputa ou vingança guiem nossa comunicação; praticar uma comunicação capaz de curar as feridas da humanidade; ser testemunhas e promotores de uma comunicação não hostil, que difunda uma cultura do cuidado, construa pontes e atravesse os muros visíveis e invisíveis do nosso tempo. Precisamos contar histórias imbuídas de esperança, assumindo com responsabilidade o nosso destino comum e escrevendo juntos a história do nosso futuro”, concluiu.
Para Frei Leandro Costa Santos, coordenador da Frente de Comunicação da Província, celebrar o Dia Mundial das Comunicações Sociais é mais uma resposta atenta da Igreja. “A comunicação exige de nós posturas atualizadas. Não à toa, uma das primeiras falas do Papa Leão XIV tratou da inteligência artificial e seu avanço irreversível. Ele a compara com o advento da Revolução Industrial e seus efeitos. Mas, lembrando ainda do Papa Francisco, que esmerou-se por anunciar uma cultura de paz. O nosso saudoso pontífice entendeu que a construção da mesma só se torna possível quando a comunicação se torna uma eficiente aliada para evitar a escalada de conflitos e polarização, promovendo a paz e a fraternidade universal.”
O Papa Leão XIV, logo no início do seu pontificado, reuniu-se na Sala Paulo VI com mais de 3 mil jornalistas que acompanharam o funeral do Papa Francisco e a escolha do novo Santo Padre. Na ocasião, ele falou sobre a busca pela verdade e reforçou a mensagem de Francisco na luta por uma comunicação desarmada e desarmante.
Que o próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais represente a continuidade de uma ponte que, há 59 anos, vem sendo fortalecida na Igreja e assumida pelos profissionais de comunicação, de forma que todos possam ser facilitadores na promoção de filhos e filhas de Deus cientes de suas responsabilidades, atentos às realidades e compromissados com o futuro, sem perder a fé e a esperança.
Adriana Rabelo Rodrigues